Papo com Ruth


Já era tarde quando o rapaz estava chegando a seu apartamento, procurou a chave dentro de sua bolsa e depois de amassar alguns papéis encontrou-a e enfiou no buraco da fechadura, girando-a rapidamente duas vezes para destrancá-la – oi Ruth – sua cadela de pelos brancos correu em sua direção sacudindo sua calda, contente por ele ter finalmente chegado de onde quer que ele tenha ido – está com fome, linda? – ela o perseguiu em direção a cozinha e latiu, concordando – o Patrick não te deu comida, não é? – ela latiu novamente e sentou-se enquanto ele enchia sua vasilha de ração – pronto, pode comer – ela afastou-se e deixou que ela devorasse sua ração.
            Em cima de sua mesa de estudo, um bilhete “Rubens, não vou jantar em casa, se vira - Patrick”. Ele fez uma bola com o bilhete e o lançou no ar acertando-o dentro do cesto de lixo do outro lado da sala – vamos estudar agora, não é garota? – ela balançou o rabo, estava sentada o observando enquanto ele folheava seus livros. A língua do animal estava para fora, sua respiração audível deixava claro que estava cansada, mas Rubens não deu importância a nada disso, continuava folheando seus cadernos e livros enquanto lia alguns trechos de suas anotações em voz alta. O garoto cochilou em cima de seus livros, Ruth latiu e o acordou – o que foi Ruth, o que aconteceu? – ela apenas sacudia sua calda freneticamente com a língua para fora o encarando, ele a ignorou novamente e outro latido ecoou pelo apartamento – Ruth, não fique latindo alto, temos vizinhos em todos os lados – ele encontrou um lápis sobre a mesa e começou a anotar algo que veio em mente. Mais um latido, dessa vez Rubens já havia perdido a paciência e sua concentração, virou o rosto para Ruth e lhe perguntou encarando-a – por que você simplesmente não fala o que você quer Ruth? – ele ficou olhando em seus olhos cor de mel por alguns segundos e voltou a escrever – eu preciso de água – Rubens arregalou os olhos e virou lentamente a cabeça em direção a Ruth, ali sentada – Ruth? Foi você quem disse isso? – ela andou em sua direção e ficou de pé – eu preciso de água – e latiu fazendo o garoto se afastar assustado e cair junto com a cadeira para o lado, desmaiando no mesmo instante.

Duas horas depois Rubens acordou, Ruth estava lambendo seu rosto para acordá-lo, o relógio da cozinha marcava três da manhã, ele estava confuso com o que parecia ter acontecido, aquilo tinha acontecido mesmo? – Ruth, eu sonhei que você falou comigo – disse ao se levantar e acariciar suas orelhas – eu acho que estou estudando demais, você não falou comigo falou? – a cadela virou a cabeça para um lado, ainda o encarando guardou a língua e voltou a dizer - eu preciso de água, Rub – ele se afastou tropeçando em suas próprias pernas e encostando-se no balcão da cozinha:
- Eu não sonhei?
- Claro que não, estou falando que preciso de água, você não me deu água.
- Meu Deus do céu, qual é seu problema? Qual é meu problema, estou louco.
- Rub, para com isso, eu só preciso de água e não vou falar mais nada.
- A-Água então... – o garoto foi até a cozinha, encheu um grande copo com água e despejou o mesmo na vasilha de água de Ruth, estava tremendo, bebeu o resto da água que estava no copo – como você nunca falou nada antes, Ruth?
- Não posso... – ela estava lambendo a água -... Falar... Sempre – depois de beber quase toda a água correu até o sofá e sentou-se – não posso falar sempre que eu quiser, depende da lua e hoje ela está boa para uma conversa.
- Mas você nunca falou comigo em outras luas – ele estava sentando-se lentamente do outro lado do sofá, ainda apavorado.
- Não tinha o que falar e não é normal um cão conversar com seu dono, quer ser chamado de louco Rub?
- Você precisa de mais alguma coisa, está confortável?
- Não vou te escravizar só por você estar assustado, mas já que está me perguntando, vou lhe dizer algumas coisas que não estão boas nem para um cachorro.
- O que está acontecendo, fiz algo de errado, te maltratei? – ele pensou um pouco – Patrick tem te maltratado?
Ruth estava de um lado do sofá, sacudia sua calda lentamente, seus olhos atentos a qualquer movimento na casa, parecia estar em busca de algo. Rubens estava mais tranquilo, estava gostando de ouvir seu cão se queixar, sentia-se como se ela realmente fosse sua melhor amiga, como sempre diziam que cães eram.
- Ninguém me maltratou...
- O que foi então?
- Eu preciso de almofadas novas, não no sofá, mas em minha cama, estou cansada de dormir ao pé de sua cama, você chuta quando dorme, sabia disso?
- De... Desculpe-me!
- Tudo bem, só compre almofadas escuras, às escuras demoram a esquentar.
- Tudo bem, vou me lembrar disso, amanhã mesmo lhe trago algumas almofadas novas.
- E a comida, não que eu esteja reclamando, mas você devia comprar um pacote enorme de ração e deixar ao meu alcance, não vou espalhar tudo pela casa.
- Tem certeza, eu me lembro de quando você comeu ração até em cima da minha cama, até hoje não sei como aquilo aconteceu.
- Eu era uma garotinha, agora eu sou uma dama, não vou fazer isso de novo. Pode confiar, mas as plantas eu ainda vou destruir, os vasos são esconderijos de ratos.
- Elas são de Patrick, você se vê com ele depois. Isso é muito assustador, você conversando comigo. Todo esse tempo eu sempre lhe dizia as coisas e hoje você pode responder o que eu lhe perguntar.
- Sempre te ouço, mesmo quando não estou no mesmo cômodo, mas não posso te responder todo dia, assim como te expliquei, acho que eu estava precisando conversar um pouco, faz tempo que não falo com alguém.
- Com quem você tem falado?
- Falei com Patrick uma vez, acho que já faz duas luas novas.
- Ele nunca me contou nada.
- Acho que ele tinha sugado aqueles papéis de cheiro horrível.
- Ele nunca se lembra de nada quando usa drogas.
- Drogas, é o nome daquilo?
- Sim.
- Então era isso mesmo, ele estava sugando uma drogas quando eu falei com ele sobre a louça na pia que estava criando mofo.
- É droga.
- O quê?
- Nada.

          Eles ficaram conversando por várias horas enquanto o dia amanhecia. Ruth estava com sua cabeça confortável no colo de Rubens enquanto ele a acariciava nas orelhas, como ela havia confessado gostar e sentir sono sempre que ele fazia isso. Falaram sobre passeios que há tempos não faziam, uma coleira nova que devia ser comprada caso ela se perca, mesmo ela afirmando não se perder nunca e ainda pedir para sair sozinha pelo menos uma vez na semana. Patrick foi assunto em um ou dois temas da conversa, Rubens acabou descobrindo que podia confiar nele mais do que já confiava e uma coisa ou outra poderia ser feita para o conforto de Ruth sem muitos gastos.
Rubens pegou no sono por quase uma hora quando Patrick chegou escancarando a porta e o acordando – bom dia meu lindo – Rubens esfregou os olhos e correu os olhos pelo apartamento – Ruth? Ruth? – Ruth chegou correndo da cozinha até o sofá, estava com algo em sua boca, algo cinzento que fedia. Jogou o que estava segurando no tapete em frente a Rubens e latiu duas vezes sacudindo sua calda – eca Ruth, um rato. É esse o rato que você falou que estava procurando? – ele ficou olhando para ela esperando resposta, mas nada – ok, você está mesmo esperando que ela responda Rubens? – Rubens gargalhou enquanto pegava um saco plástico para se livrar do rato – conversei com ela a noite toda, Patrick – Patrick também gargalhou mesmo saber o motivo da graça e cambaleou rumo ao sofá, desmaiando sobre o mesmo – obrigado Ruth, não sei o que seria de mim sem você.

 

Comentários

B. disse…
KOPSADDOPKSPKOASDAK WILFRED.
HF. Nascimento disse…
Hey, Rubens não se droga, pfvr!